Foto: Christian Cravo

 
Por Raulino Júnior
@raulinoscjunior

 

Aos 37 anos de idade e 16 de carreira, Christian Cravo, reconhecido fotógrafo baiano, se considera um curioso diante da vida. Na profissão que exerce, esse traço é essencial. E ele o utiliza, como princípio criativo, nos trabalhos que produz mundo afora. Nascido numa família de artistas — seu pai, Mário Cravo Neto, era fotógrafo; seu avô, Mário Cravo Júnior, um renomado escultor —, Christian não recusou a herança genética. Já fez exposições no Brasil, na Europa e nos Estados Unidos. Contemplado com prêmios significativos na área de fotografia, Christian Cravo publicou três livros de ensaios fotográficos e, atualmente, se dedica a um projeto que tem como intuito preservar o legado de seu pai: a criação do Instituto Mário Cravo Neto.

Você afirmou, em texto publicado na revista Muito em maio deste ano, que é muito mais um curioso do que fotógrafo. A curiosidade é uma característica obrigatória para ser um bom fotógrafo? Por quê?
Não posso afirmar se a curiosidade é uma característica fundamental para ser um bom profissional, mas certamente é um agregado. A fotografia nasce de uma vontade de eternizar algo que é eternamente mutável e, muitas vezes, efêmero, intangível. Essa vontade de “capturar” esse momento nasce de uma curiosidade pela vida; sem ela nunca se estabeleceria uma ponte, um elo onde o momento decisivo se desdobrasse aos olhos do fotógrafo.

Tudo é fotografável ou existem restrições?
Sim, certamente, tudo é fotografável. Afinal, o que é a fotografia a não ser (assim como qualquer expressão artística) uma extensão do nosso intelecto? Não é a câmera que fotografa, ela apenas captura a luz num processo químico ou eletrônico. O verdadeiro fotógrafo é a mente e o olho.

Você assinou os stills (fotos oficiais de uma produção cinematográfica) dos filmes Abril Despedaçado (Walter Salles), Cidade Baixa (Sérgio Machado) e Besouro (João Daniel Tikhomiroff). Como é trabalhar com cinema? É fácil unir essas duas artes?
Às vezes. Tive a opção de trabalhar e seguir carreira no cinema, mas sinto que meu espírito solitário é demasiadamente independente para trabalhar em equipe, seguir cronogramas rígidos e horários. Não tenho isso dentro de mim. Sou muito disciplinado, mas quando trabalho sozinho. Para mim, fazer os stills de cinema foi como um trabalho encomendado, algo mais comercial, mesmo se tratando de filmes como Besouro, em que tive uma incrível liberdade de fotografar como achasse melhor; ou, como dizem, “deixar a minha visão”.

Ao visitar países do sul da África, você disse que queria voltar as suas lentes para algo que busca dentro de si próprio: a solidão. Esse sentimento te inspira? Por quê?
A solidão é intrínseca ao humanista, ao curioso. Antes de me enveredar pela África, passei por dois momentos difíceis na vida, ambos que tratam da natureza humana: a morte prematura de meu pai e o terremoto do Haiti, no qual morreram dois amigos, um deles muito próximo. Quando voltei meus olhos para a África, não buscava o continente; mas, sim, uma rejeição ao ser humano. Este trabalho é, de fato, muito diferente do que venho fazendo, mas ainda tem a minha “identidade”, mesmo tendo ausente o elemento que me foi mais central durante a carreira: o ser humano. O fato de conseguir transformar toda a dor dos trabalhos anteriores e dores carnais (como a da morte do meu pai) para um novo projeto onde a vida é a mais celebrada, não tem preço. Foi um sentimento que eu nunca havia sentido antes.

O seu pai tem uma importância grandiosa na história da fotografia brasileira. O que falta para que o Instituto Mário Cravo Neto se torne uma realidade?
Depende de burocracias (Justiça, espólio, advogados, impostos) e também dos herdeiros, que devem entrar em acordo sobre o andamento a ser dado. Dois deles são absolutamente imaturos para este tipo de decisão. É necessária uma maturidade acima do normal. Enquanto isso, estou delegando algumas mostras e tentando manter o nome de meu pai no mesmo patamar. A próxima exposição será na Pinacoteca (São Paulo), em junho de 2012.